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Por outro lado, a luz é alguma coisa: uma qualidade ativa, capaz
de produzir efeitos. No entanto, uma qualidade nunca pode existir sozinha:
ela deve existir sempre em um corpo. Assim, para Tomás de Aquino,
a luz jamais poderia existir fora da matéria. É de acordo
com essa concepção que ele vai discutir a questão
principal: se tem sentido afirmar-se que Deus, no primeiro dia da criação,
fez a luz antes de qualquer outra coisa. Ele vai concluir que a luz foi,
de fato, como diz o Gênesis, a criação do primeiro
dia. Mas, antes, ele vai apresentar as diversas objeções
que podem ser colocadas contra essa visão:
Pode parecer que não
se deve atribuir a produção da luz ao primeiro dia.
Objeção 1. A luz,
como foi afirmado antes, é uma qualidade. Mas as qualidades são
acidentes e não se caracterizam por vir antes e sim por vir depois
. A produção da luz, portanto, não deve ser atribuída
ao primeiro dia.
Objeção 2. Além
disso, é a luz que distingue a noite do dia, e isso ocorre através
do Sol, que é descrito como sendo feito no quarto dia. Portanto,
a luz não poderia ter sido produzida no primeiro dia.
Objeção 3. Além
disso, a noite e o dia ocorrem pelo movimento circular de um corpo luminoso.
Mas o movimento circular é próprio do firmamento celeste,
e lemos [no Gênesis] que o firmamento foi feito no segundo dia. Portanto,
a produção da luz, dividindo a noite do dia, não deveria
ser atribuída ao primeiro dia.
Objeção 4. Além
disso, se disserem que se fala aqui sobre a luz espiritual, pode-se responder
que a luz feita no primeiro dia é contrastada com as trevas. Mas
no início não existiam trevas espirituais, pois no início
até os demônios eram bons. Portanto, não se deve atribuir
a produção da luz ao primeiro dia.
Depois de apresentar todas essas dificuldades, Tomás de Aquino vai
respondê-las:
Pelo contrário.
Não poderia existir dia sem luz. Como não poderia existir
dia sem isso, isso deve ter sido feito no primeiro dia. Portanto, a luz
deve ter sido feita no primeiro dia.
Tomás de Aquino discute várias opiniões sobre a questão.
Ele indica que Agostinho interpretava a produção da luz como
sendo metafórica e representando a formação dos primeiros
seres espirituais – os anjos – que seriam “luminosos” no sentido de participarem
do mundo divino. Mas Tomás de Aquino concorda com outros autores,
como Basílio e Crisóstomo, que diziam que Moisés não
falava sobre a produção de criaturas espirituais, no Gênesis,
para que o povo não considerasse essas criaturas como deuses e passasse
a adorá-las. |
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