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Em seguida, Álvares discorre sobre várias hipóteses
a respeito do surgimento das epidemias:
Algumas vezes as mesmas
doenças provêm da infecção do ar gerada pelas
imundícies, inundações, chuvas, umidade, tremores
de terra, vapores ou abundância de corpos mortos. Essa é perniciosa
não apenas aos homens mas também aos animais, como ocorreu
em Roma nos tempos de Tarquinius Superbus, quando o ar se infectou pela
má nutrição das pessoas.
Como vimos, a idéia de que o ar transmite as epidemias era já
bastante antiga. Não poderia faltar também, é claro,
a menção a fatores astrológicos:
Esses contágios
são geralmente precedidos por algumas conjunções de
astros ou eclipses com aspectos funestos, como foi a conjunção
de Saturno e Marte, no signo de Aquário, casa própria do
dito Saturno, (...) que os médicos que não ignoram Astrologia
notaram ter muitas vezes sido causa de doenças populares, e também
um antes da coqueluche do ano 1580. Pois, embora muitos autores antigos
digam que os astros são por si todos bons e não enviam nada
de mau aos corpos inferiores, no entanto nosso Senhor, servindo-se de causas
secundárias como instrumentos da justiça, permite que por
suas influências que por si são boas e salutares, os quatro
elementos se alterem tanto, que o ar, do qual nos servimos mais, absorvendo-o
continuamente pela respiração, adquira alguma intemperança
ou má qualidade contrária à nossa vida.
Álvares admite também a existência do contágio
- no entanto, utiliza uma concepção exagerada e fantasiosa
do fenômeno:
Essas mesmas doenças
também provêm muitas vezes sem qualquer corrupção
do ar, pelo simples contato e toque das coisas infectadas. Isso é
muito comum e citarei um só exemplo disso. Na cidade de Selêucia,
na Babilônia, no tempo do imperador Antonino, alguns soldados da
companhia de Avidius Cassius, movidos pela avareza de roubar, abriram certo
cofre de prata, do qual saiu um vapor ou ar infecto e aí guardado
há muito tempo, que infectou todo o império, do oriente até
o ocidente. Na mesma ocasião ocorreu a grande peste de Roma no tempo
do imperador Commodus, em que todos os dias morriam mais de 1.000 pessoas,
e isso por meio de certos homens abomináveis, que jogavam pela cidade
certas coisas impregnadas de veneno, por cujo toque uma infinidade de pessoas
foi surpreendida pela peste.
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