Capítulo 11: Aperfeiçoamento e Dificuldades da Teoria Microbiana

CONTÁGIO

HISTÓRIA DA PREVENÇÃO DAS DOENÇAS TRANSMISSÍVEIS

.
         Em outros casos, a falta de conhecimento das vitaminas levou a conseqüências muito mais graves. O episódio mais terrível foi o do estudo do beribéri, na passagem do século XIX para o século XX. Trata-se, pelo que sabemos hoje, de uma doença grave, causada pela falta de vitaminas. O beribéri é freqüente nas populações que se alimentam com grande quantidade de arroz polido (arroz branco), pois o processo de polimento retira a película que contém a vitamina B deste cereal. Até o início do século XIX, utilizava-se o arroz integral, obtido em geral de forma artesanal, batendo-se o arroz com casca e separando apenas a palha. Esse processo "primitivo" foi substituído pelo polimento industrial do arroz, criando o belo cereal branco que consumimos até hoje. Em meados do século XIX, a produção de arroz branco na Ásia aumentou muito, e sua exportação atingiu o mundo todo.

         O beribéri já era conhecido, como o escorbuto, desde as grandes navegações. Foi descrito por Diogo do Couto, que fala sobre sua ocorrência entre os marinheiros da armada de Gonçalo Pereira, na Índia: "A nossa gente ia adoecendo da doença que chamam berebere, que é inchação da barriga, e pernas, de que em poucos dias morrem, como morreram muitos, e chegou dia de dez, e de doze."

         Essa doença foi chamada, no Brasil, de "inchação das pernas", ou epidemia das "pernas inchadas", por causa de um dos seus sintomas. Podemos ver em diversos quadros de Portinari figuras humanas que apresentam a aparência de doentes do bériberi. Além desse sintoma visível (que nem sempre ocorre), há dormência dos membros, fraqueza, dificuldade de se mover, que pode se transformar em uma paralisia, sensação de alguma coisa apertando o tronco, como um cinto muito justo ("cinta epigástrica"). Pode haver asfixia e morte rápida ou lenta.

         Embora conhecida e descrita muitas vezes, essa enfermidade só se tornou importante na segunda metade do século XIX, quando em muitas partes do mundo começou a produzir grande número de mortes. No Brasil, em 1858, houve uma "epidemia de pernas inchadas" em um colégio em Mariana, matando várias crianças. Na década de 1860, surgem muitos casos, atacando tropas militares no Mato Grosso, que só se salvaram da "peste" fugindo do local. Na Bahia, a doença surge nesse período de forma esporádica, sendo descrita pelo médico José Francisco da Silva Lima. De 1863 a 1866, ele tratou ou acompanhou pessoalmente o tratamento de 51 doentes, dos quais 38 morreram. Esse autor acreditava que a enfermidade não era transmissível:

.
Página anterior
237
Próxima página

INTRO DUÇÃO
CAP. 01
CAP. 02
CAP. 03
CAP. 04
CAP. 05
CAP. 06
CAP. 07
CAP. 08
CAP. 09
CAP. 10
CAP. 11
CAP. 12
CRONO LOGIA