Capítulo 6: Do Período das Grandes Descobertas ao Século XVIII

CONTÁGIO

HISTÓRIA DA PREVENÇÃO DAS DOENÇAS TRANSMISSÍVEIS

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         As febres produzidas pelos pântanos foram estudadas, algumas décadas depois, por Giovanni Maria Lancisi (1654-1720). Lancisi foi um importante médico romano, que atendeu pessoalmente a três papas, durante sua vida. Em 1717, ele publicou um livro sobre "Os eflúvios nocivos dos pântanos e seus remédios". Nesse livro, ele descreve os "miasmas" como certas influências nocivas emanadas dos pântanos. No calor do verão, a fermentação e putrefação de animais e plantas causa uma exalação ou eflúvio, que produz doenças. Segundo Lancisi, essa influência é geral e não específica, ou seja, existe um único tipo de miasma, capaz de produzir diferentes efeitos, dependendo das circunstâncias e das pessoas atingidas por ele.

         No caso específico da malária, Lancisi supõe que ela é causada por pequenos animais que penetram no corpo e circulam pelo sangue. Isso explicaria o motivo pelo qual ela se diferencia das outras febres dos pântanos.
 

Gravura de A. Colombina (1656) mostrando a roupagem destinada a proteção contra a peste, utilizada por alguns médicos da época. O "bico" contém substâncias aromáticas, para proteger contra os miasmas transportados pelo ar. A vara serve para tocar objetos a distância, evitando o contágio.
         Para evitar as enfermidades dos pântanos, Lancisi propõe eliminá-los secando-os, plantando árvores que absorvam o excesso de água, cultivando-os, ou mesmo inundando-os. As medidas propostas por Lancisi tiveram excelentes resultados, fortalecendo e levando à divulgação de suas idéias. A teoria dos miasmas é um interessante caso de uma concepção errada que foi extremamente útil à humanidade. Como veremos, ela impulsionou muitas medidas sanitárias adotadas nos séculos XVIII e XIX que trouxeram grande melhoria à saúde pública.

         É curioso indicar o significado da palavra "miasma", que se tornou muito popular a partir do século XVIII. Lancisi utilizou "miasma" de modo muito feliz, para representar algo que contamina ou infecta o ar, e que provém da morte.  O termo "miasma" é grego. Ele significa mancha ou nódoa, e era utilizado pelos teatrólogos gregos antigos para indicar uma mancha de sangue, proveniente de assassinato. Um assassino, uma pessoa que havia derramado sangue, se tornava impregnado por um miasma, uma mancha ou impureza, um sinal maldito e indelével da morte, que o acompanhava para sempre. Portanto, o uso de "miasma" para representar os gases pútridos provenientes da morte (de substâncias podres) é bem adequado. As palavras latinas "contaminação" e "infecção" traduziam idéias semelhantes, mas não se referiam diretamente à morte. Contaminar significava inicialmente poluir, sujar, profanar, transmitir uma impureza física ou moral. Infectar, por sua vez, tinha o significado de tingir, colorir, impregnar ou misturar alguma coisa nova, que mudava a aparência.

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