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Os médicos
(...) julgaram que existia em mim uma abundância de cólera
[bílis] queimada ou seca, juntamente com uma fleugma salgada, de
tal modo que havia se desregulado a capacidade do fígado de produzir
sangue. Alegrei-me, porque essas coisas que os autores haviam me transmitido
eram confirmadas por dois mestres experientes, pois eu, que havia aprendido
que na ciência matemática todas as especulações
são muito verdadeiras, acreditei que essas coisas eram também
comuns e inseparáveis das regras de curar (...).
De acordo com minha antiga
credulidade, perguntei que tipo de desregulagem do fígado podia
ser essa que, ao mesmo tempo, aquecia a cólera amarela mais do que
ela merecia, e também gerava mais fleugma do que devia, percebendo
que um ato da mesma raiz e da mesma sanguinificação, não
poderia produzir ao mesmo tempo, no mesmo ventre, um produto duplo ou bifurcado
- ou seja, emitir abundantemente uma cólera ardente e também
uma fleugma fria e aquosa.
Os mestres experientes
ficaram em dúvida e se interrogaram com suas sombrancelhas arqueadas,
olhando um para o outro. Por fim, o mais jovem deles respondeu que a mesma
desregulagem de um fígado inflamado não podia produzir fleugma
verdadeira, mas uma fleugma abundando em sal, e a temperatura do sal era
quente e fria (...)
Apesar de não ficar muito convencido do valor da teoria, Van Helmont
precisava se curar da sarna e aceitou o tratamento recomendado: tomar purgativos,
para se purificar.
No sexto dia evacuei
quinze vezes. Enquanto isso, eles bendiziam minha transformação,
pois meu corpo havia se tornado ão fluido.Depois de mais dois dias,
como a coceira não havia aliviado sua crueldade, tomei de novo o
mesmo remédio, com uma notável revolta de meu estômago,
e ocorreu um processo semelhante de evacuação. Eles disseram
que a juventude costumava produzir o desenvolvimento da cólera.
E quando viram que apesar disso a coceira e as feridas não estavam
diminuindo, decretaram que dois dias depois eu deveria tomar o remédio
purgativo pela terceira vez.
Um pouco antes da noite,
minhas veias estavam exauridas, meu queixo havia caído, minha voz
era rouca, todo o meu corpo estava arruinado e fraco. Era difícil
para mim descer de meu quarto e andar, pois meus joelhos quase não
me suportavam (...).
Percebi tarde demais que
antes dos remédios purgativos meus intestinos eram saudáveis;
mas que agora, por falta de apetite e digestão falha, eu havia adquirido
muita fraqueza, embora a sarna se mantivesse firme e segura.
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