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O que,
exatamente, ocorre durante o contágio de uma doença, segundo
essas concepções primitivas? Há muitos modos de tentar
explicar o que ocorre. Em alguns casos, supunha-se que o contágio
introduziu alguma coisa maligna dentro da pessoa - um espírito,
um objeto enfeitiçado (como pontas de flecha mágicas), ou
algo de outro tipo. Nesses casos, a cura exige que se retire do doente
aquilo que penetrou nele.
Os feiticeiros
procuram retirar o agente maligno através da transpiração,
pela massagem, ou sugando, com a boca ou ventosas, os objetos mágicos
do corpo. Os banhos purificadores também eram recomendados em muitos
casos. Podem também ser utilizadas substâncias que produzam
vômito, purgantes, ou mesmo extrair as substâncias malignas
através de sangria. Em casos especiais, é necessário
abrir o crânio do doente, para que possam sair pelo orifício
as causas que produzem fortes dores de cabeça. Quando a doença
é produzida pela entrada de um espírito maligno, ele deve
ser afastado por preces mágicas, pelo barulho (tocando tambores)
ou mesmo batendo no corpo do doente.
Em outros
casos, supõe-se que o contágio, ao invés de introduzir
algo, retirou alguma coisa da pessoa - sua vitalidade ou sua alma. Nesse
caso, o curandeiro deve procurar localizar a alma do doente, que pode ter
sido roubada e guardada por um feiticeiro dentro de uma cumbuca, ou pode
ter sido levada para o mundo dos espíritos, por algum demônio.
De um
modo geral, os curandeiros tinham sucesso e curavam seus doentes. Pode-se
entender a eficácia de seus tratamentos a partir de conhecimentos
modernos, pois eles utilizavam muitos medicamentos de grande poder, além
de práticas importantes como a dieta. Por outro lado, é inegável
o efeito real produzido pela sugestão sobre os doentes, e todo o
tratamento mágico tendia a fortalecer a vontade e a certeza de se
curar do doente. O próprio processo de confissão, que precedia
o ritual de cura, pode ser considerado como benéfico, por aliviar
eventuais culpas do doente e colocá-lo em harmonia psicológica
com seu meio social. |
Ainda hoje, tribos africanas realizam rituais para a cura,
utilizando tambores, máscaras e imagens de divindades, como a que
vemos acima. |
Muitas
dessas concepções "primitivas" sobrevivem até hoje,
em meio às sociedades mais cultas. Na tradição judaico-cristã,
sobreviveu até hoje a idéia de que as doenças podem
ser castigos divinos pelos pecados cometidos pelo doente. Nas religiões
afro-brasileiras, a presença constante da feitiçaria e de
práticas mágicas de cura é conhecida por todos. Ao
longo de toda a história da humanidade, como veremos, essas e outras
concepções "primitivas" sempre estiveram presentes. |
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