Prezados colegas da Diretoria e do Conselho da SBHC,

     

      Gostaria de manifestar minha posição sobre a manutenção (ou não) da “história das ciências” dentro da área de História, no CNPq e em outros órgãos.

      Estamos diante de uma situação dramática, criada pelo comitê assessor de história. Para quem não se lembra, veja mais abaixo a transcrição do trecho relevante da última reunião daquele comitê. Os “outros” historiadores (os que não trabalham com história da ciência) decidiram que o comitê assessor do CNPq não analisará mais pedidos de pesquisadores que não sejam historiadores “de carteirinha”, ou seja, os que não tenham formação em cursos de graduação e pós-graduação em história (excluindo história da ciência), que não participem das associações de história (excluindo a SBHC), que não participem de congressos de história (excluindo os de história da ciência) e não publiquem trabalhos nas revistas de história (excluindo as revistas de história da ciência). Os pedidos de quem não se enquadre nesse perfil seriam re-encaminhados aos comitês de outras áreas (por exemplo, biologia, física, etc.), por não serem considerados por esses assessores como pertinentes à área histórica.

      Ora, devemos nos lembrar que, no Brasil e no exterior, a história da ciência não é feita, majoritariamente, por pesquisadores cuja formação primária foi história. Trata-se de uma área que acolhe pesquisadores com muitas formações diferentes, cada um com a possibilidade de dar diferentes contribuições à área. O olhar com que um historiador social, ou um historiador da economia, ou um historiador das religiões, pode contemplar a história da física ou da astronomia, é diferente do olhar de um físico ou astrônomo, ou de um sociólogo, ou de um filósofo, ou de um psicólogo, ou de um antropólogo (apenas para citar alguns exemplos). Querer restringir a pesquisa da história da ciência a pessoas com determinada formação básica seria um erro. O que se deve exigir, sim, é que a pesquisa seja realizada de forma competente, profunda, tomando conhecimento do estado da arte e utilizando a metodologia adequada para responder a cada tipo de questão. Ou seja: deve-se lutar pela qualidade da pesquisa na área, não permitindo improvisações e amadorismo (seja por parte de pessoas com formação puramente científica, seja por parte de historiadores sem treino em história da ciência).

      Durante muito tempo, as agências de fomento brasileiras enquadraram a história das ciências como uma sub-área da história. A decisão sobre onde encaixar nossa área é essencialmente prática, e na verdade não envolve uma longa discussão teórica sobre a relação entre história e história da ciência. Se o comitê assessor de história respeitasse a nossa especificidade e não criasse problemas – e isso, de fato, ocorreu durante um bom tempo – não haveria nada a mudar. Porém, nos dois últimos semestres, a atitude de dois grupos distintos de assessores foi desastrosa. Diante da situação DE FATO criada por eles (e não por nós), não há o menor sentido em lutar para permanecer dentro da área de história – como defende a Presidente da SBHC. Pelo contrário: é necessário lutar para obter um lugar independente para, futuramente, se houver interesse e condições práticas melhores, NEGOCIAR (de forma respeitosa) o retorno à área de história.

      Diante da atual situação, portanto, minha opinião é que os historiadores da ciência devem pleitear uma autonomia em relação à história, podendo (para fins práticos) a história das ciência ser enquadrada dentro de um campo multidisciplinar, ou transdisciplinar.

      É preciso aproveitar de forma adequada a situação negativa que foi criada, e agarrarmo-nos à sugestão dos próprios assessores de história, de que deve ser criado um comitê autônomo de história das ciências. Qualquer outra atitude, de lutar para ficar na situação anterior, só pode prejudicar nossa área de pesquisas.

      Cordialmente,

     

      Roberto de Andrade Martins


     

    Relatório do Comitê Assessor Extraordinário  de História

      Reunião de 30 de junho a 04 de julho de 2003.

      (trechos selecionados)

     

       Alguns pedidos de renovação não foram atendidos, após análise cuidadosa pelo CA dos processos, constatando a existência de relatórios e/ou projetos insatisfatórios, pouco detalhados e inconsistentes.

     

      As solicitações encaminhadas a outros Comitês dizem respeito a projetos nos quais o  perfil dos pesquisadores e o conteúdo do projeto não se enquadram na área de História, ainda que tenham sido a ela encaminhadas pelos proponentes.  A maioria desses projetos que se apresentam como História da Ciência, ainda que  haja casos de projetos considerados de Ciência Política e de Linguística.

           

      Os sucessivos Comitês de História vêem encontrando,  reiteradamente, problemas em lidar com projetos em História da Ciência, área que tem se mostrado produtiva e importante para o cenário científico brasileiro, mas que, no entender desse Comitê, agrega nitidamente dois grupos de pesquisadores: 

  •       os primeiros são historiadores, ou pesquisadores oriundos de outras áreas, mas com produção inequivocamente histórica; trabalham em Instituições de pesquisa histórica ou em Programas de Pós-Graduação em História (avaliados pelo Comitê de História da CAPES, portanto formam historiadores), freqüentam os congressos e outras reuniões da área de História e são reconhecidos por seus pares como atuantes na área de História.  Suas pesquisas são em História da Ciência, entendida como uma sub-área dos estudos históricos; 
  •       o segundo grupo é formado por cientistas de outras áreas acadêmicas, que atuam em instituições de pesquisa e em programas de pós-graduação que não são da área de História (não formam historiadores), não freqüentam congressos e outras reuniões da área de História e não são reconhecidos por seus pares como historiadores.  Suas pesquisas são História da Ciência enquanto aspecto da área científica de inserção (Física, Química, Biologia, Medicina etc), a ênfase do projeto recai no tema científico e o conteúdo histórico inexiste, exceto enquanto temporalidade cronológica que delimita a problemática  em questão.

      Esse comitê considera, naturalmente, que ambos os grupos têm ”cidadania” no campo científico, mas, como todos os comitês anteriores, enfrenta a dificuldade em  analisá-los e reconhecê-los como pertinentes à área de História.  Novamente diante desse problema, que se perpetua nas agências de fomento, o comitê atuou, no caso de projetos apresentados como de História da Ciência, com os seguintes critérios: